quinta-feira, janeiro 19, 2006

Carminha e a Física

Carminha nasceu num dia de julho, não sei dizer com exatidão qual. Se sentia indignada de dividir um berçário com tanta gente, afinal ela não tinha pai e mãe? Por que ficava ali, jogada as traças? Era mês de férias, mas pai nem mãe tem direito a tira licença. Muito menos com uma pobre recém-nascida para criar.
Em protesto, ela chorava, isso incitava os outros bebês a chorarem também. Logo o berçário inteiro caía aos prantos. Nada daquelas imagens de novela, daquele monte de bebês calmos, de olhos bem fechados. Carminha começou sua revolução ali mesmo.
Quem mais sentiu sua revolta foi sua mãe, sempre que ia amamentá-la, sentia quase uma mordida em seu seio "Nossa, minha filinha estava com fome. Bilu, Bilu". Vejam bem, ela não era má, mas mesmo sem ter a menor noção de mundo, ninguém gosta de ser abandonado.
Não se preocupem, como toda pessoa madura, ela superou isso, afinal eram seus pais e não eram más pessoas. Ela até se apegou a eles com tempo.
O grande problema foi passar pela infância, com todas as suas limitações como precisar de alguém para lhe alimentar. Era terrível ter de primeiro engatinhar, uma forma tão pouco digna para se locomover. Mas quando aprendeu a andar as coisas mudaram um pouco de figura, sentia-se mais independente. Curiosamente, ela preferia andar, não gostava muito de correr. Exceto pelos dias em que estava enraivecida, ela corria pra porta que dava para o quintal, juntava todas as suas forças e gritava, apertava as mãozinhas e os braços sacudiam de tanta força que fazia.
Não poder falar então era ainda pior. Ninguém entendia que "Bah, bah, bah" significava "Estou com fome, me alimentem" e "BuH, Buhhhh" era "Me limpa, droga", frenquetemente os dois eram tomados por "Me alimentem, sou um bebê e preciso virar um pequena rolha de poço".
Isso tudo gerava insatisfação no nosso anteprojeto de mulher. Mas isso passou no dia e que seu pai trouxe um balão de hélio para Carminha "Olha o peixinho minha filha".
Muito impressionada com o objeto decidiu "Pronto, é isso. Vou flutuar". Por que não havia pensado nisso antes?
Lógico, que aos dois anos de idade ela desconhecia as nossas famosas leis da física. Seu mundo era Carminhocêntrico e sendo ela o centro de tudo, poderia fazer qualquer coisa - preciso ressaltar que também era um mundo pequeno e se restringia mais ou menos do início da rua até o quintal. Mas flutuar era o de menos. E assim, lá foi Carminha a flutuar pela sala.
A comoção foi instantânea "Maria, segura que a menina tá voando". Para os pais isso se tornou um problema, mas também foi só pra eles, porque ela achava aquilo tudo ótimo.
Com o tempo tudo se ajeitou, sua mãe colocou alças em todos os seus vestidos e sempre que precisava lhe dar banho ou comida puxava-a com um cabo de vassoura que tinha um preguinho na ponta.
Quando crescida jamais teve problemas com criancice de moleque, porque sempre que começavam a perturbá-la, flutuava até o telhado de casa. Quando teve sua primeira paixonite de infância e o viu dando um beijinho no rosto de uma menina chata da outra turma, Carminha passou o resto do dia no telhado do colégio. Foi preciso chamar sua mãe para conversar com ela "Carminha. Ô, minha filha. Desce pra falar com a mamãe, desce".
Carminha ainda flutuou durante muitos anos. Porém, um dia durante sua primeira aula de física o professor falou sobre a lei da gravidade. Ela prontamente protestou "Como assim? Quer dizer que nada pode simplesmente tirar os pés do chão e voar sem fazer esforço?" só para receber um atordoante "Não".
Depois disso Carminha nunca mais conseguiu flutuar, mas decidiu ter um filho e, mais importante, que o pobrezinho jamais teria de estudar física e que nunca lhe diriam que ele não poderia flutuar. Quem sabe o jovem até aprimorasse a técnica para um vôo mais refinado. Mas uma coisa era certa, Física jamais.

2 comentários:

Sic disse...

Nossa Rafa que lindo, lindo, lindo adorei a Carminha... lindo, lindo, lindo, lindo

E tu disseste que só conseguiu pensar nisso? Te manca

Antó disse...

Odeio Fisica tb! Justamente pq ela nos limita , claro ajuda tb a entender o pq de muitas coisas , mas deixar de voar não foi algo que eu gostei muito tb! hehehe Pensar dói e saber também! hehehe mas é sempre bom! Se tiver filhos tb vou fazer eles esquecerem q a fisica existe hehehe