terça-feira, março 27, 2007

Neruda

Meu aniversário está próximo, estive pensando em como sempre escrevo pouco próximo ao meu aniversário, e me peguei em meu próprio exagero, o blog tem pouco mais de um ano. Então pensar em sempre é hiperbólico. Porém, um presente do ano passado, quase esquecido coitado, me fez querer escrever. É um livro de poesias, meu ponto fraco, aprecio poucos poetas por me sentir tocado por poucos, jamais me ocorreu que um volume esquecido de "Cem sonetos de amor" pudesse me tocar. Grande erro, me ganhou desde a dedicatória, a do autor e a feita à mim. O segundo poema até agora foi especial:
II
Amor, quantos caminhos até chegar a um beijo,
que solidão errante até tua companhia!
Seguem os trens sozinhos rodando coma chuva.
Em Taltal não amanhece ainda a primavera.
Mas tu e eu, amor meu, estamos juntos,
juntos desde a roupa às raízes,
juntos de outono, de água, de quadris,
até ser só tu, só eu juntos.
Pensar que custou tantas pedras que leva o rio,
a desembocadura da água de Boroa,
pensar que separados por trens e nações
tu e eu tínhamos que sempre amar-nos,
com todos confundidos, com homens e mulheres,
com a terra que implanta e educa os cravos.
***
Será que eu e você também seremos assim?

quinta-feira, março 22, 2007

Afogado

Esses dias tem chovido tanto que acho que a cidade vai inundar. Nos meus sonhos, até nos que tenho acordado, ela costuma inundar mesmo, mas nada flutua, só os cabelos. É bom que em sonho a gente pode respirar debaixo d'água ou vai ver que nem respira.
Engraçado isso de sonhar com água, muita por sinal, me disseram hoje, sem saber que eu pensava nisso, que ela representa a sexualidade. A minha daqui a pouco deve estar me afogando. Mas todo mundo se perde por causa dela, uma amiga falou até de cimentar suas intimidades, mas nem em sonho eu faço isso com o meu.
Eu tento trocar de elemento, mas só o que me vem à cabeça é fogo e ele tem um efeito mais "local" do que a água. E eu tô sozinho, mas também eu tô sempre sozinho, e o jeito é dar "jeito" sozinho. São umas punhetas insólitas, ardidas, mas como já comprovei, por pura indiscrição, com alguns amigos que tiveram coragem de admitir, algumas são bem melhores do que algumas trepadas que já tivemos.
Nesses últimos meses tenho andado mais do que nunca com meu guarda chuva. Um daqueles enormes, já couberam três pessoas debaixo dele, preto e indiscreto. Acho que durante a inundação ele me salvará a vida ou pelo menos vai me garantir o momento íntimo de dividir o guarda chuva com outra pessoa.

segunda-feira, março 19, 2007

Alguns Andares

Outro dia eu estava na janela do apartamento de um amigo. Senti aquilo que a Clarice descreveu uma vez como um súbito impulso suicida que as vezes se tem próximo à janelas. Se eu já fosse leve quem sabe voasse.

terça-feira, março 06, 2007

Internet

Tudo parece me levar a crer que somos vítimas da morte do romance. Isso soa dramático mas o termo é exatamente esse. As obras que têm mais romance são antigas ou se passam em épocas posteriores a nossa. Tudo que é atual me parece ter um toque de desespero, uns amores atrapalhados pela própria pessoa muito mais do que pelo tempo ou adversidades ocasionais, não consigo deixar de sorrir quando lembro do adjetivo "desamparo". A impessoalidade de ferramentas como o messenger me fazia atestar isso, um conto do Julian Barnes também. Hoje eu percebi que não é bem assim, quando você está offline mas ainda conversa com alguém, pode ocorrer das mensagens chegarem com atraso. Esse atraso me deixou com a angústia de não saber se ele não falava comigo ou se era só o atraso. Converso com poucas pessoas, costumo apoiar o cotovelo na mesa e a mão no queixo, fazendo uma corcunda, e fico esperando. É essa espera faz você se sentir desamparado, o descuido com que a gente esquece das coisas na tela. Mas isso pra mim derruba toda aquela baboseira que eu acreditava sobre impessoalidade, consigo ser mais impessoal com algumas pessoas que vejo todos os dias, muito mais do que seria pela internet. Não é nem um pouco difícil ser distante, mas ser próximo também não é. Acredito que está tudo nas pequenas coisas.