quarta-feira, janeiro 31, 2007

Amanhã

Ele anda de olhos fechados até o banheiro, conhece o caminho e isos lhe garante um pouco mais de tempo na escuridão antes de ter de se acostumar com a luz, artificial porque o Sol ainda nem nasceu. Ou lava os cabelos ou se masturba, não dá pra fazer os dois, se demorar demais alguém bate à porta, punheta sempre ajuda a acordar e ele toma outro banho antes do almoço, são sempre três: um de manhã, um antes do almoço e outro quando chega em casa. Mas dessa vez vai atrasar mesmo assim. O rosto fica branco gelo por causa da espuma, pega o barbeador, logo na primeira passada ele volta com o tufo de pêlos machados de vermelho e o branco gelo é tingido de vermelho também. Fecha os olhos. Passa a lâmina mais uma vez, outro corte e mais outro e mais outro, é assim que é seu rosto, cortado, manchado. O branco quase some no vermelho. Deixa os braços soltos no ar para snetir como eles vão se contorcendo naturalmente, dois galhos mortos queimando. A pia vai transbordando, a água gelada toca os pés e vai inudando o ambiente, quando alcançar o rosto vai perder a senbilidade dos cortes. Ainda d eolhos fechados deixa o corpo cair para o lado, os braços apontam para o alto, quando encostarem na água vão fazer o barulho de algo em brasa que é molhado. Seu corpo cai na água com um baque surdo. Ele afunda, quando abre os olhos muitos objetos flutuam, pobre do papel higiênico que estava preso, não pôde nem tentar se molhar só em parte e ficar flutuando. Não ia adiantar, a água já quase alcança o teto. Alguém bate na porta.

terça-feira, janeiro 30, 2007

Amor (Perdi a Conta dos Entitulados "Amor")

Ele não conseguia raciocinar muito bem, mas sabia que esse seria o dia "Ela tá ali. Não tem outro jeito. Vou lá e vou falar pra ela. Nada de Sr. Dalloway hoje. Eu vou chegar e vou falar. Tem tanta gente". Ele atravessou o salão. Sua Clarissa estava lá, divertida, uma taça na mão, os cabelos soltos. Um conhecido até tentou lhe chamar, mas ele só conseguiu fazer uma gesto de "espera". Parecia que as pessoas tinham decidido se colocar no caminho da pior forma possível, todos dispostos a atrapalhar. Ela conversava, dava sorrisos "Como ela faz isso tão facilmente?", se misturar às pessoas era algo que ela fazia muito bem, os sorrisos gratuitos para coisas que algumas vezes nem eram tão interessantes, mas pediam atenção e ela a dava. O ciúme em boa parte era dos sorrisos, dados de forma aparentemente descuidada. A última pessoa que tentou se interpor foi uma mulher que, dessa vez sim de forma descuidada, foi removida para o lado. Chegou até as costas dela, sentiu seu perfume e falou baixo "Eu te amo". Ela só conseguiu perceber que alguém atrás lhe dirigira a palavra, se voltou, o olhou nos, deu um dos sorrisos descuidados, lhe saudou e perguntou o que ele havia dito. Ele tomou seu rosto com as duas mãos e lhe deu um beijo. Afastou o rosto dela com delicadeza "Eu disse que eu te amo".

domingo, janeiro 28, 2007

Estiagem

Andei lendo um livro do Caio, acho que o texto dele mais Clarice que já li. Bonito, poético, descobri que poético demais pra mim, tenho pouca sensibilidade à poesia. Me achei seco, e por causa disso descobri que no meu peito tem um buraco, bem pequeno, mas tenho certeza que se eu for acertado bem nesse buraco, ele se torna uma fenda e cresce até me partir em dois. Tudo isso porque eu estou seco, um corpo em que uma camada de verniz impede de sentir poesia. As vezes eu acho que dá para quebrar o verniz, mas as vezes eu também acho que sem o verniz não deve ter nada de mim. As vezes é música ou quando estou andando, sinto que se deixar meu corpo cai inerte, mas me preocupa o que vai ser de mim sem esse corpo seco e insensível.

domingo, janeiro 21, 2007

Punch Drunk Love

Ele se adianta antes dela levantar o olhar e a beija, a porta nem está totalmente aberta. Ela tem a sensação de algo vermelho ter passado pelo olhos, uma vertigem muito leve a toma fazendo se inclinar para frente e se apoiar nele. Ele fecha os olhos e passa os braços pelo seu corpo até a mão direita parar na cintura e a esquerda no ombro, sente ela se apoiar no seu corpo. Para ambos o mundo começou a dar um giro até parar onde tudo começou. Uma janela no final do corredor deixa a luz do sol entrar, fazendo a parede branca parecer infinita. Alguém na rua passa e sua música invade o ambiente. Um homem jogando uma chave para o alto passa pelos dois no corredor, parecendo uma sombra na parede infinita. Os lábios se distanciam, a testa dele se inclina um pouco para baixo tocando a dela. Na rua um pedaço de tecido vermelho foi levado pelo vento. Levou também as folhas de um galho. A luz do sol sobre os olhos fechados dá uma sensação de quente e vermelho. No final do giro eles se abrem e fitam os do outro.
Seu nariz toca o dela "Oi..."
Ela sorri e apoia a cabeça no peito dele "Olá".
Inevitável dizer que houve um leve suspirar.
Assim o mundo terminou um giro.

quarta-feira, janeiro 17, 2007

Leveza

A única luz no quarto vinha da televisão, luz azulada porque o filme havia terminado faz tempo, contrastanto com a pele e a parede o azul se perdia num tom de lilás. Havia também um pouco de pôr-do-sol filtrado pelo vidro da janela. Estavam deitados naquela mesma posição por muito tempo. Qualquer um dos dois que quebrasse o silêncio teria de falar sobre algum assunto desagradável:
- Por que você tem de fazer as coisas assim? - Ele levanta o torso e se apoia no braço, agora a luz da televisão só ilumina metade do rosto a outra era pôr-do-sol.
- Porque sim ué. - Nada conseguia fazê-lo tirar os olhos do teto nem descruzar os braços.
- Pára com isso. - Ele odiava aquela forma descuidada de dar respostas.
- Não dá. Sabe, a coisa que eu mais queria dessa vida era ser leve, mas não dá.
- Por que não dá? - Seus olhos tinham uma agressividade triste, frustrada.
- Sei lá, sou metade bigorna, eu acho...

terça-feira, janeiro 09, 2007

Ainda em Dezembro

Eu andei querendo fugir esses últimos tempos. Na verdade, não precisava ser uma fuga de verdade com drama e fotos em pôster, tava mais para um escapada. Sozinho, com a roupa do corpo e meu guarda chuva, ele sempre vai comigo. Andei pensando em cigarros também. Fumar debaixo de chuva deve ser desagradável. Eu quase não abro o guarda chuva, só o carrego comigo mesmo.
No dia da escapada eu estava com a bermuda branca com listras verticais e horizontais que formam quadrados brancos no tecido e a blusa preta com a gola e o final das mangas brancos. A SIC me disse que estava bonito, falamos um pouco das suas dores, guardei as minhas. O que eu poderia dizer? "Ah, eu quero fugir" ou então "Olha, eu tô indo embora. Não volto nunca mais. Te amo viu". Como explicar que nada demais acontecia que eu só queria fugir? Eu com a roupa do corpo e meu guarda chuva.
Lembrei de um texto da Clarice de uma moça que fugia do namorado, ela pelo menos estava fugindo de alguém. Andei contabilizando e descobri que praticamente todas as pessoas de quem eu gosto, gostam da Clarice, não me sinto obrigado, mas também preciso dizer "Gosto de você". Com a garota do texto eu tenho em comum a vontade de fugir, de encontrar uma saída de emergência, porque tem alguma coisa me sufocando e eu nem sei dizer ao certo o que é. Acredito que seja a vida. É ela aquilo que andava preso na garganta e não me deixava falar. A vida está crescendo em mim feito um câncer e nem me deixa mais respirar. Acredito que eu deveria estar agradecido.

segunda-feira, janeiro 08, 2007

Super Mercado

- OLHA Ana, salgadinho da Hello Kitty!
- Ai Raphael, que bichice.
- Mas... Vem com chaveiro...
- NOSSA? Vem com chaveiro? Cadê?
-... Estamos cada vez mais caricatos...