quinta-feira, março 02, 2006

Asas

Dessa vez eu lembro de tudo com exatidão. Carla nasceu no dia 2 de dezembro de 1987 às 2 da manhã, na cidade de Gramado. Sua mãe havia se mudado faz pouco tempo e ainda se espantava com o frio e se maravilhava com as flores que cresciam nos canteiros da estrada. Costumava até bater fotos das flores.
Supreendou a todos por ter nascido 1 semana antes do esperado, mais ainda por ser um bebezinho lindo, não tinha aquela cara de joelho bem característica de recém-nascidos, mas principalmente por ter nascido com um par bem curtinho de asas. Sim, asas. Como as de passarinho, brancas com manchas de marron, mas bem pequenas.
De início isso foi terrível pra sua mãe, que além de ser mãe de primeira viagem estava completamente despreparada para ter um criança com asas. Não que houvesse muitas mães preparadas para isso, mas alguma no mundo deveria estar. Infelizmente, esse não era o caso de Dona Estefana, que além de aprender a trocar fraldas precisou abrir buracos em todo o enchoval para que as blusas não amassasem as asinhas.
Ela estava preparada para a parte da educação, ensinar a criança a dizer "por favor", "obrigado", usar o peniquinho de plástico e tudo mais. Porém, como não havia precedentes de outra criança com asas no mundo, de fato Carlinha era única, Estafana fez o lógico, tentou ensinar a menina a voar "Vai filha, bate as asinhas pra mamãe".
O lógico nem sempre é o mais adequado a se fazer, e isso se mostrou de forma bastante frustrante para Carlinha e sua mãe, a primeira por acreditar estar decepcionando a segunda e a segunda por não se achar boa o suficiente para educar a primeira.
Elas moravam em um apartamento no quinto andar, de frente para o nascente, exatamente como sua mãe queria. Logo quando começou a andar, definiu a janela como seu local favorito da casa, sempre tentava escalá-la para ficar olhando o céu, o problema é que sua mãe não aprovava muito a idéia "Não minha passarinha, você não voa. Então tem que ficar aqui em baixo". Mas ela sempre daa um jeito de subir e ficar sentada na janela.
Durante alguns anos a criança foi alvo da mídia e dos cientistas, algumas coisas sensacionalistas sairam em revistas e exames de sangue e genéticos foram realizados. A mídia foia primeira a perder o interesse pela criança que se tornou notícia velha "Daqui uns dez anos a gente volta e mostra como ela está depois de crescida. Quem sabe juntamos ela com o bebe da Johnson e a primeira criança de proveta" . Para os outros algo simplesmente inexplicável, que surgiu do nada e provavelmente não iria se repetir.
O grande desafio mesmo era começar a escola. Para a menina aquilo era amedrontador, haveria um monte de outras crianças, mas nenhuma seria igual a ela. No primeiro dia a única amizade que ela conquistou foia de Ana Maria, uma linda ovelinha amarela feita de tricô, um cachecol verde também de tricô, com olhos amendoados e tristonhos, um rosto mais expressivo que uma boa parte das pessoas naquela escola. As duas simpatizaram de imediato uma com a outra.
Como era de se esperar, as outras crianças, passado o susto de ver uma menina com asas, também tentaram faezr amizade com Carlinha e descobriram que, além de ter asas, ela era uma garota muito inteligente e, muito mais importante, era muito legal. Todas com exceção de uma, Raquel, uma menina de cabelos escorridos e olhos malvados.
Com o tempo a sala toda acabou fazendo amizade com a ela e, consequentemente, com Ana Maria. Desconhecendo que as crianças, as vezes, também são más umas com as outras, Carlinha tentou se aproximar de Raquel no final da última aula da segunda feira, mas essa que, a bem da verdade, era má com as outras crianças o tempo inteiro, lhe lançou um daquele olhares malvados e disse "Sai de perto de mim. Você é um monstro. Você acha que os outros gostam de você? Eles têm medo de você. Monstro!". Carlinha sentiu um vento frio passar por todo seu corpo e parar no coração, ele bateu mais depressa, talvez para compensar a sensação de gelado que se fez sentir.
Nesse dia Carlinha foi cabisbaixa o caminho inteiro até a sua casa e era um desses dias em que nada parece dar certo, porque nem poderia ficar com a sua mãe que precisava trabalhar até mais tarde, quem ia cuidar dela era Dona Mercedes, uma velinha que dormia muito depois do almoço.
Assim que a velinha dormiu, Carlinha foi pro seu local favorito da casa. Ficou encarapitada na janela igual a um passarinho, abraçando Ana Maria que lhe havia sido dada de presente pela professora. Foi justo nesse dia, provavelmente o mais mais azarado dos poucos que ela teve, que ocorreu justamente o que sua mãe mais temia. Um vento muito forte bateu e Carlinha perdeu o equilíbrio. Caiu com Ana Maria nos braços. Antes de chegar ao chão perguntou para a ovelinha o que fazer, mas esta, que sempre fora uma ovelha, não sabia.
O que ninguém sabia, ou pelo menos Dona Estefana e Carlinha não sabiam, é que quando algo tão extraordinário como uma criança nascer com asas acontece, várias outras coisas extraordinárias se seguem. Assim, antes de alcançar o chão, Carlinha simplesmente abriu suas asas e as bateu. A verdade é que ela nunca havia precisado voar antes, mas agora voava.
Voou pra bem longe. Ninguém prestou atenção numa garotinha voando, porque ninguém tinha tempo de olhar pro céu. Somente quando Dona Estefana chegou em casa e acordou de forma desesperada e quase matando a velhinha do coração que alguém deu falta de Carlinha. Durante muito tempo su amãe a procurou. Ela teve outra filha, essa não tinha asas, mas era tão especial quanto a primeira. Sua mãe sempre lhe mostrava fotos da irmã mais velha, contava o quanto ela era especial e como as duas se dariam bem.

2 comentários:

Sic disse...

Suas crianças são fantásticas, vou abrir um fã clube, eu amo as Carlinhas do Rafa, e a propósito, adorei a participação especial de Ana Maria no texto, precisamos promover o encontro dela com Rebequinha, Robervanderson, Ferdinando, Ermenegildo e Raiana Raiara kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

Beijos e sabia que a Sic fez um aninho? nooooooossa nem parece!

Anônimo disse...

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