segunda-feira, maio 22, 2006

Formigas...

Caronas com a minha irmã nunca valem muito a pena, sempre tem alguma coisa que faz com que o percurso demore do que tomar o ônibus. A parada estratégica dessa vez pelo menos foi por uma boa causa, ela tinha de ir buscar a filha de uma conhecida que ia para o hospital. Para mim não tinha nenhuma novidade nisso, eu já sabia que ela faz isso uma vez a cada duas semanas e também já sabia que a garotinha tem cancêr.
Pra variar eu fiquei no carro. Minha irmã vei trazendo a menina. Ao contrário do que eu esperava, ela não era magrela, não estava com olhos fundos, nem parecia estar a beira da morte. Quem sabe fosse mais fácil lidar com ela se a sua aparência fosse essa. Pelo contrário, ela era linda, pequena, com a carinha meio rechonchuda, havia acabado de cortar o cabelo porque tava caindo e tinha um seu estojo de maquiagem novo na mão.
Por que isso é tão ruim? Porque eu lembrei que ela não era uma morimbunda e sim uma criança. Porque crianças não tem a menor noção de mortalidade. Porque é absolutamente horrível você ouvir uma criança fazendo manha porque não quer tomar soro, ao invés de fazer manha pra ganhar pirulito. Porque uma garotinha não deve ter pouco cabelo, a menos que ele esteja apenas começando a crescer. Essa é uma inversão perversa da ordem das coisas, crianças não deveriam morrer, a função principal delas é esfregar na minha cara que eu vou morrer antes delas.
Mas o pior foi ela se sentir constrangida comigo, porque ela estava ficando careca. E eu não tive a menor coragem de dizer pra ela que não se preocupasse com pessoas como eu. Porque pessoas como eu são superficiais e egocêntricas e jamais vão conseguir olhar pro mundo fora do seu próprio umbigo. Daí eu fiz o que eu faço melhor, me fechei e não dei mais um pio. Babaca.

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