quarta-feira, julho 30, 2008

Esboço

Sempre imaginei como seria quando fosse mais velho, ansiava por isso. Mas, agora que eu não preciso mais esperar por isso, o tempo passou e a vida, bem... as coisas nem sempre saem como esperamos. Não consigo mais lembrar do meu passado, às vezes esqueço até dos últimos cinco minutos, nem mesmo em momentos de emergência, outro dia num cruzamento, em um meio fio qualquer, fiquei completamente desnorteado, não sabia pra onde ir, nem porquê havia saído de casa. Todo o conhecimento, tudo, está indo embora, é um disparate dizer que levamos cultura pro túmulo, não vou levar nada, ninguém leva, quiçá os faraós. Até a morte, à qual eu mantinha reverência e que me causava tanto medo, quando chegar será um estranha.
Jamais me preparei pra falta de consciência, me distenciei do meu corpo, e só percebi porque a mão de um estranho, eu mesmo, tocou meu ombro, como se a alma estivesse descolada do corpo, olhando-o de frente. Desesperei-me pra retomar meu corpo, que o passado e as memórias vão pro inferno - só Deus sabe o quanto deles eu gostaria de esquecer - pelo menos que o meu corpo seja meu. É que ainda insisto em viver.
Um dia consegui lembrar de um beijo, o toque macio dos lábios de alguém, quem eu já não sei mais, mas com certeza era macio, macio e morno, foi como se voltasse àquele momento de se perceber homem pela primeira vez, devo ter ficado tão desconcertado quanto. Mas a pele do meu rosto vincada e a barba, tão clara, me lembram do tempo, do quanto ele passou, mesmo assim demoro pra entender que são meus olhos, pequenos, escuros, meu nariz, até entender que sou eu no espelho.
Então envelhecer é assim? Nenhuma serenidade, nenhum amadurecimento. Eu não consigo lembrar como são esses estados de espírito. Só da humanidade, dela e algum desejo, o qual eu sinceramente espero ter algum dia saciado, pra, pelo menos antes, tê-lo sentido realizado. Não com ela, me envergonha tê-la desejado, diz ser minha filha, a bem da verdade, poderia dizer ser a Lua e eu só poderia agradecê-la a visita. É tão bonita...

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