terça-feira, julho 10, 2007

O Barco (faz muito tempo que estava na geladeira)

Seu primeiro encontro foi obra do acaso, um momento de certo constrangimento para ambos, quando se anda na mesma direção de uma pessoa e ao tentar desviar acabam ambos indo para o mesmo lado. Ele não foi cavalheiro lhe cedendo a passagem, foi bastante ríspido franzindo o cenho e andando na outra direção, mas ela não pode notar pois olhava timidamente para baixo. Entretanto, isso tudo só aconteceu após seus olhares terem se cruzado, o que teria poupado ambos de infortúnios futuros, talvez não, afinal, não se pode saber como as coisas poderiam ter sido.
O primeiro desses infortúnios foi a paixão, reconhecida de imediato por ela, ele a confundiu com um estranho nervosismo, sua mão esquerda tremia leve e involuntariamente quando estava nervoso e essa era uma de suas poucas demonstrações de sentimento da qual apenas sua mãe estava a par, e era uma demonstração involuntária. Cerrou o punho e seguiu seu caminho. Ela era uma mulher infeliz, tamanha era sua infelicidade que todos os outros infortúnios da vida haviam decidido abandornar-lhe, jamais passara fome ou qualquer outra privação, porém, exceto quando do nascimento de seu único filho, fato guardado um pouco mais para o futuro, jamais experimentara um momento de felicidade por mais fugaz que fosse. Quando a providência lhe trouxe uma esperança de amor fez o que qualquer infeliz faria, agarrou-se o mais forte que pode.
Ela teve sua primeira experiência de jovem apaixonada, supirando e procurando-o com o canto dos olhos enquanto trabalhava na livraria. Esperava uma segunda oportunidade de vê-lo. Ele evitava aquele caminho a todo custo, sempre que lhe vinham à mente os olhos azuis melancólicos da moça sua mão tremia, com o tempo passou a sentir seu corpo gelar, uma sensação que partia das extremidades até alcançar o coração, causando-lhe um certo terror devido a aceleração do pulso. Mesmo assim, ele as vezes fechava os olhos e conseguia ouvir as passadas com exatidão, depois o brilho do azul do vestido sob a luz esmagadora do sol da tarde, o busto sombreado pelo guarda sol, terminando nos olhos, sempre terminando nos olhos.
Sua mãe, a única que conseguia compreender os silêncios e a rispidez do filho, notou a transformação que os dias operavam no homem. Sentou-se à mesa com sua caneca de café, tomou um gole pequeno e, sem as cerimônias de um detetive que desvenda um grande mistério, lhe explicou o que acontecia "Você está apaixonado", ele levantou o olhar com um expressão de dúvida "Você quase não come, olha pela janela a toda hora e agora anda o tempo todo limpo. Você está apaixonado meu filho. Ou isso ou está com verme. Em todo caso aqui tem uma pílula do mato, mas se eu estiver certa de primeira, sugiro que você fale com ela". Ele levantou-se e tomou a pípula "Leva o guarda chuva que vai chover".
Começava a anoitecer quando ela saiu, não se via o sol terrível daquela terra que punia em vida os pecados dali, mas também não se viam as estrelas e a lua, só nuvens avermelhadas como se fosse sangue e não água que lhe formassem. Andava sem pressa, já se acostumara com a idéia desconfortável de chegar ensopada em casa, um feliz equívoco, porque assim que os primeiros lhe tocaram os cabelos ele apareceu, nesse instante ela se deu conta que se apaixonara por um vulto de olhos castanhos, agora loiro, corpulento, aspecto rústico, porém, bonito. Falaram pouco, caminharam sem pressa na chuva.
-Depois eu continuo

Um comentário:

Sic disse...

Termina loooooooooogo, ébi de ti...

Beijo