- Renato eu tem um câncer crescendo em mim.
- O quê? - ele pula da cadeira com taquicardia, essa mulher ainda o mata do coração.
- É isso que tu ouviu. Eu vou ter câncer de próstata e a culpa é tua.
- Porra Maria, pára com isso, Tu ainda me matas do coração.
- Renato, eu cortei meu pau fora por tua causa, porque tu dissestes que só podia se casar se eu fosse mulher, mas tu só me come se for que nem viado. Por que isso Renato?
- A gente casou, não casou? Que tu queres mais, Maria?
- Que tu digas que me ama. O meu pau, eu cortei o meu pau fora porque eu te amo. E tu? Tu não ligas a mínima pro meu amor.
- Pára com isso, vem cá, vem meu bem. Dá um beijinho.
Ela dá um beijo arrependido, com os olhos fechados e lábios umidecidos e mornos:
- Vo fazer um café.
Ela pega o pó do café, pensa em coá-lo na calcinha. Nojento demais, não virou mulher pra ser uma dessas desesperadas. Dramática talvez, até folclórica, mas desesperada não. As panelas ficam no armário de baixo, o saquinho branco é da soda caústica. Um olhar mais demorado na embalagem. Fica olhando a água ferver, as vezes olha de canto de olho pra porta do armário:
- Toma o café.
- Vem cá, deita comigo vem.
Todo dia ela faz o café olhando pro monstro dentro do armário.
Os sábados são sempre horríveis, é dia de surra. Ele sempre chega às 19 prontinho, com o cinto na mão, a fivela presa nos dedos:
- Ai, pára Renato. Não faz isso meu amor.
- Vem cá, porra.
- Não meu amor, não faz isso.
Quando sai sangue ele pára, fica satisfeito. Caí no chão chorando:
- Oh Maria, meu amor me desculpa, meu amor.
- Tu só diz que me ama quando tá bêbado.
- Mas eu te amo meu amor. Eu te amo. Mas Maria, é que não é de verdade.
- O que não é de verdade?
- Não é buceta de verdade Maria - ele chora coma cabeça encostada na coxa dela, passando a mão até próximo a virilha - Não é buceta Maria...
Ela levanta, ajeita a cabeça dele no chão:
- Onde tu vai amor?
- Vou preparar um café pra ti.
Na cozinha ela coloca a mão por dentro da calça, não importava quantos dedos ou força que ela fizesse, nada nem um pouco de prazer. Até a dor que sentia era pouca. Abre o armário de baixo, dessa vez ela pega a panela e o saquinho branco. O pó de dentro é azul, ela pega só uma pedrinha:
- Tá ruim o café, Maria.
- Tá sem açúcar, pra passar o porre.
- Ah, brigado Maria. Tu me ama né?
Coloca a cabeça dele no peito e faz um carinho:
- Lógico que amo. Cortei meu pau fora por tua causa. Não foi?
No outro dia Renato vomitou tudo o que podia. Passou mal o resto da semana também. Quando foi no médico o diagnóstico:
- O Sr. Está com Gastrite.
- Ha meu amor, vou ter de preparar teu almoço todo dia agora.
- Maria, tu és uma santa - passa a mão nos cabelos dela e sorri satisfeito com a devoção da mulher.
O pobre só piora. Ela prefere usar as pedrinhas, amassa com o dedo e salpica na comida:
- Só tu cuida de mim Maria. Tu és uma santa.
- É porque eu te amo.
Um mês depois ele morre, magro, sem sangue. Uma semana depois Maria é presa por assassinato "Travesti é acusado de matar companheiro envenenado". Maria aparece sorrindo pra câmera sentada na delegacia, as mãozinhas na coxa e as pernas cruzadas.